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João Luiz Vieira

Está pensando em se casar com um robô? Ainda não é legal, mas possível

João Luiz Vieira

18/09/2017 04h00

https://www.flickr.com/photos/chiaralily/5008136726/

Um engenheiro chinês, especialista em inteligência artificial, casou-se com uma "mulher" criada por ele mesmo em abril deste ano. Isso mesmo: ele declarou amor eterno a uma representante do sexo feminino em que decidiu como seria cada parte de seu corpo. Teve como testemunhas sua mãe, amigos e companheiros de universidade. O rapaz, de 31 anos, disse que mantinha um relacionamento razoavelmente curto com sua senhora, a robô Yingying, mas a paixão foi avassaladora. Depois de três anos, ele pediu sua mão gélida em casamento.

Não há legalidade na cerimônia. Relacionamento entre humanos e androides ainda não estão contempladas na legislação chinesa. Nem na japonesa ou na coreana. China, Japão e Coreia são nações onde essa proposta tem sido praticada com mais rapidez que a ética sexual ainda é capaz de alcançar. Por que lá? A ideia de casar com um indivíduo sem sangue veias e sem coração chegará ao Brasil?

Asiáticos, especialmente japoneses, têm um comportamento peculiar em relação à sexualidade. No Japão, o conceito de "fetiche" ("fechi" em japonês) é tratado de maneira mais informal que em países latinos. A palavra é amplamente utilizada entre os jovens. Eles comentam seus próprios fechis em sala de aula. Não é algo embaraçoso, nem representam falha moral. Pode ser um desejo inexorável por um robô ou por algo produzido à base de cyberskin, material sintético usado para imitar a pele humana. Comumente usado em bonecas infláveis, substitui silicone e borracha.

Se voltássemos duzentos anos no tempo, o que ouviríamos se propuséssemos a ideia de homens se casando com homens ou de uma cerimônia entre indivíduos de raças diferentes em países como os Estados Unidos? A natureza do casamento é mutável. No futuro, quem sabe decidiremos com quem, por qual motivo e por quanto tempo estaremos associados a alguém? Casamento é, sim, uma sociedade que pode ou não envolver amor.

As relações, porém, precisam de atritos. Como pedir isso de um robô? As relações emocionais e sexuais com robôs não deve extinguir o sexo com humanos, mas, sim, levam-nos a alguns questionamentos. Há muitas relações trabalhadas através da internet, sem ritos outrora relevantes, como um jantar antes e um cigarro depois, e menosprezando valores subjetivos de quem está do outro lado da conexão.

Há muitos jovens que tentam ter namoradas, mas preferem as relações com computadores. Não sabem como interagir com meninas, mas com computadores, sim. Meninas também têm medos de avançar certos limites morais. As pessoas também desejam experiências sexuais diferentes e/ou não querem se comprometer com um relacionamento.

No Brasil seria possível manter um relacionamento com um robô? O Código Civil brasileiro define que "o casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges". O que isso quer dizer: ele deve se realizar no momento em que o casal manifesta a sua vontade. É impossível, até o momento, garantir que um robô seja capaz de declarar que quer casar com alguém até que a bateria (ou algum mecanismo que garanta sua existência) acabe.

Casar-se com um robô, hoje, significa que você adquiriu um bem móvel, não um marido ou uma mulher. E se a máquina puder declarar sua vontade de contrair núpcias? Respondo com outra pergunta: será o sentimento dela ou foi programada para tanto? A inteligência artificial, apesar de avançadíssima, ainda depende de um ser humano para expressar qualquer sentimento ou mesmo realizar alguma ação.

Apenas realizará o que foi programada, ou seja, qualquer expressão de vontade ou sentimento será tendenciosa e determinada pelo seu proprietário-programador. Devemos lembrar que permitir um enlace com um ser incapaz de expressar a sua real vontade, abre precedente para que um indivíduo torne legal, por exemplo, a zoofilia, ou seja, o relacionamento sexual entre um homem ou uma mulher e seu animal de estimação. O engenheiro chinês não quer nem saber. Ele afirmou que pensa em viver com Yingying até que a morte dele os separem.

*Com a colaboração da advogada Fernanda Prado Sampaio Calhado e do psicólogo clínico e professor de psicologia analítica Walter Mattos.

Sobre o autor

João Luiz Vieira, 47, é jornalista, roteirista, letrista e educador sexual, ou sexólogo, como preferir. Ele tem dois livros lançados como coordenador de texto: “Sexo com Todas as Letras” (e-galáxia, fora de catálogo) e “Kama Sutra Brasileiro” (Editora Planeta, 176 páginas). É sócio proprietário do site paupraqualquerobra.com.br e tem um canal no YouTube: sexo_sem_medo.

Sobre o blog

No blog dialogo sobre tudo o que nos interessa para sermos melhores humanos: amor e sexo. Vamos encurtar o caminho entre a dúvida e a certeza, e quanto mais sabermos sobre nós, teremos, evidentemente, mais recursos e controle a respeito do que fazer em situações inéditas ou arriscadas de nossa intimidade. Trocaremos todas as interrogações por travessões. Abra seu cabeça, seu coração e... deixa pra lá.

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